Creio que deva ter notado os avanços e mudanças ocorridas no ecossistema financeiro brasileiro nos últimos anos. Além da estabilidade, com presidentes longevos e discretos, taxas de inflação e juros básicos dignos de países de primeiro mundo. No cenário microeconômico, aumento da concorrência em meios de pagamento, empréstimos, seguros, investimentos e negociação de dívidas, com taxas mais atrativas e melhores serviços.

Por Marcos Morita e Antônio Dirceu de Miranda

Todas essas transformações, ainda que não suficientes para tirar a economia do marasmo, são frutos da Agenda BC#, aperfeiçoada pelo atual presidente Roberto Campos Neto e lançada por seu antecessor.

Mas o que é agenda BC#?

Em resumo, trata-se de uma pauta de trabalho de longo prazo da instituição, suportado por 4 grandes pilares estratégicos, a saber:

Inclusão: talvez você não conheça, mas há cerca de 60 milhões de pessoas, ou ¼ da população, sem acesso a serviços bancários. Para quem vive em zonas nobres, pertence às classes mais abastadas e possui contas em vários bancos, esta afirmação pode soar estanha, todavia é realidade em muitas comunidades, nas quais não se consegue comprovar residência para abrir uma conta corrente.

Fintechs sociais surgem para cobrir essa lacuna, oferecendo microcrédito, cartões pré-pagos, contas correntes digitais e moedas sociais como forma de inserção ao sistema financeiro. Comodidade e dignidade aos outrora desbancarizados(1). Um novo olhar será dado também ao cooperativismo, expandindo-o através de ações como empréstimos sindicalizados e depósitos interfinanceiros cooperativos (2).

Competitividade: um dos pilares mais percebidos, caso você seja pessoa física, jurídica, tomador ou investidor. Um fato recente foi a queda nas taxas de descontos dos cartões de crédito e antecipação dos recebimentos pelos comerciantes, resultado da entrada de novos entrantes no mercado. Como exemplo, a participação das duas maiores empresas caiu de 84,5% para 69,1% no período 2016-2018.

Dezenas de novas fintechs: bancos digitais, negociação de dívidas, investimentos, funding, criptomoedas, empréstimos e seguros, também conhecidas como insurtechs(3), apoiadas por investidores-anjos e aceleradoras, criando um robusto ecossistema com mais de 500 empresas e alguns unicórnios(4).

Aqui é esperado ainda mais competitividade nos próximos semestres, com a adoção de inovações como pagamentos instantâneos(5) e o modelo de Open Banking(6), implantados em países europeus e na Ásia, em especial no mercado chinês.

  • Transparência: aprimorar a comunicação entre o banco, investidores, parlamentares e o grande público, evitando assimetria de informações com o uso de publicidade e principalmente mídias sociais. Um instrumento bastante interessante, apesar de não tão divulgado, são os relatórios Focus(7), os quais trazem expectativas de mercado bastante confiáveis.
  • Educação: face a crise econômica, são comuns noticias sobre o endividamento das famílias, superando a preocupante barreira de 60% em Maio. Não obstante a situação atual, somos também um povo que em sua maioria compra por impulso, parcela sem pensar na taxa de juros e não tem reservas financeiras, seja para uma emergência ou aposentadoria.

É nesta lacuna que atua este último pilar do BC, conscientizando o cidadão para o hábito de poupar, desenvolvendo projetos sobre educação financeira para o público de baixa renda e em escolas, de modo que a próxima geração tenha uma mentalidade diferente da atual. É este também o nicho de diversas fintechs de gestão financeira.

Concluindo, mesmo que você não tivesse ciência desta pauta, certamente por ela foi afetada, felizmente de maneira positiva. Este é um dos papéis desenvolvidos pelo competente corpo técnico da autarquia, atuando de maneira eficiente nos últimos anos, assegurando a estabilidade do poder de compra da moeda e um sistema financeiro sólido e eficiente, missão encontrada na primeira página do site e destacada logo abaixo do nome do regulador.

Marcos Morita e Antônio Dirceu de Miranda, são autor e coautor respectivamente de textos para o blog da Bankrisk School of Banking.

Para saber mais:

Site do BC: https://www.bcb.gov.br
Radar de Fintechs: https://fintechlab.com.br/

Referências

  • desbancarizados: denominação utilizada aos cidadãos sem acesso ao sistema financeiro;
  • depósitos interfinanceiros cooperativos: instrumento que possibilita a transferência de recursos entre as cooperativas de crédito para acertar suas posições de caixa, conhecida entre os bancos tradicionais como interbancário;
  • insurtechs: startups do segmento de seguros;
  • unicórnios: startups com valor de mercado estimado em mais de 1 bilhão de dólares. Nubank, PagSeguro e Stone são unicórnios do ecossistema financeiro;
  • pagamentos instantâneos: transferências monetárias eletrônicas entre diferentes instituições, nas quais a transmissão da mensagem de pagamento e a disponibilidade de fundos para o beneficiário final ocorre em tempo real, e cujo serviço está disponível para os usuários finais durante 24 horas por dia, 7 dias por semana e em todos os dias no ano;
  • open banking: compartilhamento de dados, produtos e serviços pelas instituições financeiras e demais instituições autorizadas, a critério de seus clientes, em se tratando de dados a eles relacionados, por meio de abertura e integração de plataformas e infraestruturas de sistemas de informação, de forma segura, ágil e conveniente;
  • relatórios Focus: resume as estatísticas calculadas considerando as expectativas de mercado coletadas até a sexta-feira anterior à sua divulgação. Ele é divulgado toda segunda-feira. O relatório traz a evolução gráfica e o comportamento semanal das previsões para índices de preços, atividade econômica, câmbio, taxa Selic, entre outros indicadores;